MATÉRIAS DOS MUNICÍPIOS COM OS EVENTOS SOCIAIS RELIGIOSOS ESPORTIVOS E CÍVICOS.
Filho de Jorge Ferreira da Cruz e D. Joana Ferreira da Cruz, padre Aristides
foi uma figura marcante da história política dos legalistas da Paraíba, no
semi-árido Vale do Piancó. Sua marca registrada na história é fruto não só de sua
carreira política mas também de sua trágica morte, sendo ele trucidado por
integrantes da Coluna Prestes em um barreiro.
Esse artigo tem base em pesquisa, livros e Literatura de cordel, seus fatos na narração, feita na mesma semana na imprensa Estadual, pelo senhor Sebastião Dantas, testemunha ocular.
Assim fincando raízes não só em suas coerentes posições, mas também na cidade.
É provável que uma certa "rivalidade", que pode ser notada no Brasil, entre Nordestinos e Sulistas tenha também alimentado esse foco de resistência na cidade de Piancó, aos pés da Serra de Santo Antônio [carece de fontes]. Contudo não pode ser explicado a real motivação dos "heróis do Piancó", mas essa batalha esta listada como uma das grandes resistências a Coluna [carece de fontes].
Como supor que essa incursão de revoltosos no território paraibano teria como epílogo uma tragédia na Vila de Piancó [carece de fontes].
Claro na Wikipédia devemos nos conter apenas a imparcialidade, porém a mesma não é observada em vários livros de história, onde a defesa da atitude do grupo de Prestes é diretamente ligada as idéias do escritor e nem de longe contestadas [carece de fontes]. Por esse motivo não está clara a idéia que levou a um padre do interior nordestino, ligado a política local, e identificado por sua população como um grande líder, a organizar um grupo armado, e muito menos os ideais que levaram alguns civis a se juntarem nesta causa [carece de fontes].
De evidente, temos apenas o fato de não discutirmos - pois não há dúvidas - o trucidamento frio e requintado do Padre, chefe da política local, e de mais 16 pessoas, entre as quais estão o Prefeito Municipal, funcionários públicos e pessoas humildes [carece de fontes].
Sendo assim, esta lógica nos leva a crer que nem tudo que lemos sobre Prestes é verdade, e que o fato de sua passagem pelo sertão agrediu a população, pois para muitos nordestinos o nome Coluna Prestes é clara referência a má conduta militar e um tempo de medo e crueldades que por muitas vezes, como é o caso de Piancó, faziam uma cidade inteira fugir, aguardar e retornar para suas casas e lojas, agora saqueadas pelos rebeldes [carece de fontes].
Quando Sargento Arruda fazia a distribuição do armamento e munição, e Ten. Benício organizava os quatro piquetes a Coluna penetrava na vila pela rua do Conselho Municipal.
Segundo Sr. Dantas os primeiros disparos foram da Coluna, já Pe. Otaviano, em seu livro "Os mártires de Piancó", afirma que o primeiro tiro fora dos piancoenses. Histórias populares dizem que o primeiro oficial vinha montado, vestindo culotes, paletó azul-marinho e portando uma bandeira branca.
Mas não há certeza.
Sargento Arruda e outros resistiram na casa do Juiz Dr. Abdon Assis em frente ao Conselho. A Coluna recuou, retornando vinte minutos depois procurando envolver a Vila pelo nascente e poente. Do lado Sul havia dois piquetes, um comandado pelo alfaiate Isidoro e Francisco Lima, e outro por amigos de Pe. Aristides na casa do Sr. Mario Leite.
Foi possível manter resistência até às 14:00 horas, sendo feita uma retirada dos piancoenses, uma vez verificada a impossibilidade material de prolongar a luta. Entretanto, o pessoal do Padre continuou resistindo ainda por meia hora quando, para facilitar o ataque, os rebeldes jogaram uma granada numa das janelas e tomaram as salas da frente, havendo ainda alguma resistência brevemente cessada, com recuo dos sitiados para o interior da casa onde estava o Padre. Em fuga foram atingidos José Lourenço e João Monteiro. Esse último, embora ferido, conseguiu escapar.
Também escaparam uma criada e duas crianças que se evadiram às 13:00 horas.
"Perdemos um oficial, que todo o Piancó queimado não pagaria, mas, também o chefe, Padre Aristides, foi para a sepultura, num barreiro, com seus próprios pés"
Pediu o padre para todos garantia de vida, solicitação que teve o consentimento dos rebeldes sob a condição de deporem armas. Pegado o Padre em às mãos, para logo começarem os ultrajes.
"Ao Remº Padre Aristides Ferreira da Cruz.
Tendo chegado ao nosso conhecimento a falta de obediência as nossas paternas admoestações, feitas pessoalmente a Vosso irmão, para fatos que desabona inteiramente a dignidade sacerdotal e até mesmo do homem de bem, o que infelizmente vemos comprovado e ao domínio de todos, com pesar retiramos de Vosso irmão, o exercício de todas as sagradas ordens, até que tenhamos a obediência que sempre temos recebido do nosso clero.
Prezo ao Sagrado oração de Jesus que o irmão, bem se compenetre da gravíssima responsabilidade que tem diante de Deus, servindo de escândalo a Igreja de Nosso Senhor Jesus Cristo."
Paço Episcopal da Paraíba. Em 16 de Julho de 1912. Adauto, Bispo Diocesano.
A TRAGÉDIA DO PADRE ARISTIDES TAMBÉM EM ROMANCES
O sacerdote-político — morto por
soldados da Coluna Prestes, em 1926, no Piancó, Sertões paraibanos — não está
apenas nos livros de História, na Imprensa e nos folhetos de cordel
"[Para que me credencie a
defender minha verdade], começo por manifestar a humildade de saber que existem
outras verdades — e que elas são tão sustentáveis quanto as minhas; e
[...] a única razão pela qual [...] um democrata passa a ter o direito de
defender sua verdade é exatamente o respeito que ele manifesta pela verdade
alheia." — Mário Covas
(1930-2001), em discurso no Senado Federal, no ano de 1989.
Evandro da Nóbrega
Escritor, Jornalista, Editor
http://druzz.blogspot.com
druzz.tjpb@gmail.com
Escritor, Jornalista, Editor
http://druzz.blogspot.com
druzz.tjpb@gmail.com
Este material é também gentilmente
reproduzido pelos seguintes URLs:
*Blog Cultural El Theatro, de
Elpídio Navarro [www.eltheatro.com];
*Portal PS on Line, de Paulo
Santos [www.psonlinebr.com]; e
*Jornal A União On Line
[www.auniao.pb.gov.br]
Este é mais um daqueles textos que parecem agradar
aos leitores e que começam assim: "Poucos sabem, mas a verdade é
que...".
Pois bem, pouca gente sabe disto, aqui, na Paraíba,
terra onde os fatos se deram — mas a verdade verdadeira é que o padre Aristides
Ferreira da Cruz (1872-1926), um dos "mártires de Piancó", não é
citado apenas por livros de História, na Imprensa e em folhetos de cordel da
Paraíba em particular e do Nordeste em geral.
ÉRICO VERÍSSIMO & DOMINGOS PELLEGRINI
Ele, o padre Aristides, figura histórica mui
conhecida dos sertanejos, de há muito também se tornou personagem (meio de
ficção, meio de realidade) de pelo menos um par de romances de dois importantes
escritores nacionais: o romancista gaúcho Érico Veríssimo e o escritor e
contista paranaense Domingos Pellegrini.
Sobre Érico Veríssimo, não carece dizer nada, tão
conhecido é dos leitores, mesmo os de hoje. Além do mais, veio a ser pai do
escritor e cronista Luís Veríssimo, outro imenso artista de nossas Letras. Mas
é talvez necessário aduzir algo sobre o paranaense Domingos Pellegrini, não tão
citado em nossas plagas, apesar de já haver lançado uma penca de livros
relevantes — e de já ter recebido dois Prêmios Jabuti de Literatura, em 1977 e
2001.
Pellegrini, nascido em Londrina (PR), no ano de
1949, já lançou uma pá de livros, destacando-se especialmente no conto, no
romance, na poesia, no livro juvenil. Entre suas obras, a ênfase vai para Terra
vermelha (a história da colonização do Paraná); O caso da Chácara Chão;
e O homem vermelho (contos), os dois últimos premiados. O multifário
Pellegrini — escritor, poeta, jornalista, publicitário, articulista, cronista e
figura bem conhecida e amada em Londrina — reside na tal Chácara Chão do título
de um de seus livros. E escreve principalmente para o Jornal de Londrina
e para a revista Globo Rural, entre outras publicações.
LENDO O “BACHAREL FEROZ”
Érico cita o padre Aristides no romance tripartite O
arquipélago [Editora Globo, Porto Alegre, 1961-1962]. Quem leu essa trilogia
ainda na década de 1960, pôde intuir: para colocar o sacerdote piancoense como
personagem de sua obra romanesca, Veríssimo sem dúvida inspirara-se no
imperdível livro Coluna Prestes: Marchas e combates.
Vem a ser o fiel relato feito pelo
"secretário" da mais longa marcha revolucionária já vista pela
Humanidade, o Dr. Lourenço Moreira Lima. Era ele o "bacharel feroz",
de família paraibana, filho do segundo presidente do Tribunal de Justiça do
Estado, o desembargador Joaquim Moreira Lima e neto do comendador de igual
nome.
Veríssimo deve ter lido a segunda edição da obra de
Moreira Lima, saída pela Editora Brasiliense, em 1945, com 631 páginas (a
primeira edição, em dois volumes, aparecera em 1931). De todo modo, o Padre
Aristides surge, aí, como personagem por assim dizer eventual ou en passant.
O mesmo ocorre com o uso que dele faz Domingos
Pellegrini em sua bela história No coração das perobas [Record, Rio de
Janeiro, 2002] — embora sua presença tenha real importância para a trama dos
dois romances.
PIANCÓ, POR SI SÓ, JÁ SIGNIFICARIA PAVOR
Tupinólogos há que sustentam: Piancó quer
dizer ‘evolução’. Para outros, significaria ‘terror’, ‘pavor’, ‘aquele que leva
medo aos inimigos’. Tal nome foi dado a um dos chefes indígenas dos coremas que
habitavam a região depois conhecida como Vale do (rio) Piancó.
Pavor foi exatamente o que sentiu a então Vila de Piancó,
no Alto Sertão da Paraíba, quando, a 8 de fevereiro de 1926, soube da
aproximação da Coluna Prestes, que, egressa do Ceará e do Rio Grande do Norte,
adentrara o território paraibano. Não era realmente "a Coluna
Prestes", mas apenas um pequeno grupo de um dos Destacamentos da própria.
Ao amanhecer da terça-feira, dia 9, praticamente
todos os habitantes da Vila tinham dado às de Vila-Diogo — isto é, fugido para
as serras, fazendas ou localidades vizinhas, levando pertences.
Ficou em Piancó apenas reduzido aglomerado de civis
e militares armados, sob a liderança do polêmico chefe político local, o padre
Aristides Ferreira da Cruz. Esse sacerdote estava suspenso das ordens da Igreja
Católica, desde 1912, isto é, havia 14 anos, por viver maritalmente com uma
moça.
Com amigos, o padre Aristides montou quatro
piquetes para receber à bala possível invasão da Vila pelos homens de Prestes.
BANDEIRAS BRANCAS NOS TETOS
Ocorre que, tendo visto bandeiras brancas pelas
estradas e em tetos de casas, muitos revolucionários da Coluna achavam que
iriam ser recebidos em Piancó sem resistência.
Desta forma é que um pequeno grupo — formado apenas
por alguns poucos homens do Destacamento Cordeiro de Farias, sob o comando do
capitão Manoel de Oliveira Pires (capitão Pretinho) — desceu a ladeira que dá
para a Vila de Piancó. O capitão Pretinho, muito querido pelos revolucionários,
ia à frente, a cavalo, vestido à gaúcha, com suas bombachas e lenço vermelho ao
pescoço.
Vamos suspender um pouco o relato sobre o que houve
na Vila de Piancó para relembrar algo do que ocorrera poucos dias antes, no
Ceará e no Rio Grande do Norte, com os Destacamentos da Coluna Prestes,
inclusive envolvendo o capitão Pretinho.
FOI DIFERENTE DE CRATEÚS
Poucos dias antes — mais exatamente na madrugada de
13 para 14 de janeiro, na Vila de Crateús (CE), a 354 quilômetros de Fortaleza
e cuja quase totalidade da população também fugira espavorida —, esse mesmo
capitão Pretinho participara, com muitos outros homens da Coluna Prestes, do
cerco à pequena mas importante localidade cearense, onde havia entroncamento de
ferrovias.
Nessa ida a Crateús, registrou-se acirrado
confronto entre a milícia cearense e os revolucionários, no momento liderados
pelo tenente João Alberto, comandante de um próprio Destacamento da
Primeira Divisão Revolucionária.
PRETINHO FANTASIADO DE MENDIGO
O capitão Pretinho entrara em Crateús vestido de
mendigo, a fim de observar a movimentação das forças inimigas.
No domingo anterior, o padre Juvênio, então vigário
de Crateús, advertira sobre a quase certeza de os rebeldes de Prestes passarem
pela Vila. Aconselhara aos fiéis que procurassem ficar a salvo de qualquer
tiroteio, retirando-se para povoados ou distritos, serras ou fazendas. Poucos
ficaram na sede municipal.
De sua parte, o tenente Peregrino, da Polícia
Militar cearense, reuniu uma centena de soldados para fazer frente aos
possíveis invasores. Esses tinham muita experiência militar e não chegaram de
uma vez. Preferiram dividir-se em pequenos grupos, que se acercaram de Cratéus
por diferentes pontos.
Mas, de repente, na tarde do dia 16 de janeiro, um
dos grupos faz contato com a milícia legalista. Esta, abrigada numa igreja,
abriu fogo contra os revolucionários, iniciando-se cerrado tiroteio na Praça da
Estação Ferroviária.
Não foi possível desalojar as forças legalistas que
atiravam do templo e, nesse “pega-pra-capar”, morreram o tenente Tarquínio
e o cabo Antonino, conhecido como Cabeleira, depois sepultados pelos
companheiros nos arredores de Crateús (bairro da Boa Vista).
COLUNA PRESTES EM ARNEIROZ
O Destacamento do tenente João Alberto
entrara no Ceará nas imediações da cidade de Ipu. Ultrapassara os trilhos da
ferrovia para Sobral e ocupara não só esta localidade, como também Nova Russas,
Nova Olinda e Crateús.
Quando o grupo de João Alberto partiu finalmente da
Vila de Crateús foi para, entre os dias 25 e 26 de janeiro, alcançar a Vila de
Arneiroz, no Sertão de Inhamuns, ainda no Ceará e às margens do rio Jaguaribe.
Foi aí que se reuniu à outra parte da Coluna Prestes, que chegara à mesma
localidade e ficara à espera deles.
Também ali aderiu aos revoltosos o Sr. Pedro Costa,
chefe político da localidade de Várzea Alegre, mas expulso dela por perseguição
política (mais ou menos como ocorrera bem antes com o padre Aristides, em
Piancó, sendo que o sacerdote paraibano, diversamente, era do situacionismo).
NO CEARÁ, MAS SEM JUAREZ TÁVORA
Interessante é que os
revolucionários haviam chegado ao Ceará (e dele saído) sem contarem com a
presença, em seus efetivos, do único oficial cearense da Coluna Prestes,
o capitão tenentista (e também comandante) Juarez Távora.
Ele fora preso pelas forças
legalistas logo depois da incursão a Teresina. O capitão Juarez somente
voltaria a se reencontrar com seus companheiros de Coluna na segunda quinzena
de janeiro de 1927, já em Mato Grosso.
COLUNA VINHA COM 1,5 MIL HOMENS
Em terras cearenses, para fugir à
perseguição, confundindo as milícias governamentais e as tropas irregulares de
jagunços, os 100 homens comandados por João Alberto tiveram que marchar
forçadamente, fazendo até 100 km por dia. João Alberto fez tais movimentações
para dar cobertura ao restante dos Destacamentos, que puderam invadir o
território cearense, por outras áreas, quase sem resistência, embora por ínvios
caminhos.
Duas semanas depois de partir de
Teresina, portanto, o comandante João Alberto e seus 100 homens já estavam
novamente reunidos, já nas imediações da fronteira com o Rio Grande do Norte. A
Coluna Prestes, a essa altura, contava com uns 1 mil 500 homens.
ALGO MAIS SOBRE ARNEIROZ
Saindo de Arneiroz, os revolucionários... Bem,
antes de prosseguirmos, façamos pequena pausa. O termo “Arneiroz” merece
comentários, por digressivos que pareçam. O termo original era arneiros,
plural de arneiro (sinônimo de arnado), significando “terreno
arenoso”, “terra infértil”, “terreno estéril”, “terra sáfara”, “terra seca”,
“crivo”, “joeira”. Vem do latim arenarius [local de muita areia] ou arenaria
[areal, lugar de onde se tira areia].
O étimo faz parte de uma constelação de palavras
usadas por escritores como Vergílio, Ovídio, Cícero e outros: arena
[areia, lugar cheio de areia, arena, terreno, anfiteatro]; arenae,
plural do anterior [mas com o sentido de bancos de areia, deserto, gladiador,
palco de circo]; arenaria [areal]; arenosus [substantivo =
terreno arenoso]; arenosus, arenosa, arenosum [adjetivo = arenoso, como
se lê principalmente na Eneida, de Vergílio]; arens, arentis
[adjetivo = seco, ressequido, árido, abrasador, sedento]; areo, ares, arae
[do verbo aere = estar seco, ser abrasador, estar com sede]; aesco
[do verbo arere = tornar seco, secar, secar-se, perder a umidade]; aridus
e ardus [seco] etc.
No latim medieval/português arcaico existia a forma
arenariola, diminutivo de arenarius ou arenaria. E em
Portugal há localidade com a designação de Arneiros, que se passou ao Ceará,
transformando-se depois em Arneiroz.
JUAZEIRO E PADRE CÍCERO
Com o que podemos retornar a nossa história. Saindo
de Arneiroz, evitou a Coluna Prestes encontrar-se com os ajuntamentos de
jagunços e fanáticos, reunidos em torno do Juazeiro do Padre Cícero Romão e
imediações. Para isto, a Coluna teve que marchar em direção ao Leste. A 29 de
janeiro, os revoltosos atravessaram a estrada de ferro que liga a Capital
cearense, Fortaleza, à dita cidade de Juazeiro. Isto foi feito nas proximidades
de Iguatu.
No Ceará, apenas 20 voluntários aderiram aos
revolucionários, com eles seguindo caminho, diferentemente do que ocorreu com a
família Feitosa, que, apesar de fazer oposição ao governo cearense, recusou o
convite de se juntar aos revoltosos em sua marcha pelo Brasil.
“BATALHÕES PATRIÓTICOS”
De qualquer modo, a adesão desses novos voluntários
compensava, em parte, a perda de seis companheiros, vitimados pela malária no
Maranhão e no Piauí. O maior perigo, agora, entrando no Rio Grande do Norte e,
depois, na Paraíba, seriam os jagunços ou milicianos irregulares. Esses grupos,
reunidos à Polícia, perseguiam tenazmente os revolucionários, a exemplo dos
chamados “batalhões patrióticos” — um dos quais se formara recentemente no
Juazeiro do Padim Ciço, reunindo romeiros, devotos e cabras do chefe político
Floro Bartolomeu.
Antecipando o que ainda será contado adiante: um
contingente desse “batalhão patriótico” — a cavalo, armado até os dentes e com
a santa ira provocada pelo trucidamento do padre Aristides — chegou a seguir o
rastro do Primeiro Batalhão Revolucionário, já a partir de um dia depois de sua
saída do Vale do Piancó.
NO RIO GRANDE DO NORTE
Já no extremo Sudoeste do Rio Grande do Norte —
cuja fronteira atravessaram no dia 3 de fevereiro de 1926, nas proximidades de
São Miguel —, os revoltosos mudaram de rumo para o Sul, com vistas, em termos
gerais, a atingir a Paraíba e, depois, a cidade de Triunfo, em Pernambuco.
Avançaram para o território paraibano, nesta ordem:
primeiramente, o Destacamento de Cordeiro de Farias; depois, o comandado por
Djalma Dutra; e, finalmente, o Destacamento liderado por Siqueira Campos.
Quando a Coluna alcançou a fazenda Maniçoba [Não
confundir com outras fazendas da mesma designação, no Nordeste, como a antiga
fazenda Maniçoba das Pedreiras, em Pernambuco], ficou a três léguas de
distância da serra do Pereiro, na divisa do Ceará com o Rio Grande do Norte.
O grosso da Coluna subira a serra
do Pereiro pela ladeira dos Miuns, enquanto o Destacamento de Djalma Dutra ia
pela outra ladeira, a da Esperança, a poucas léguas de distância daquela. A
tropa começou a subir as encostas pelas 5 h da tarde, terminando essa subida na
manhã de 4 de fevereiro, quando o capitão Pretinho alcançou a Coluna, depois de
bater uma força inimiga que se confrontara com seu esquadrão, destacado em
serviço de reconhecimento.
A ladeira de Miuns galga pela
encosta da montanha (serra do Pereiro) em ziguezagues terríveis — uma autêntica
trilha de cabras silvestres, coberta de pedras soltas de todos os tamanhos e
coruscando por entre altos penedos pontiagudos. Dá passagem a apenas um homem
de cada vez.
RUMO A PATOS (PB), TRIUNFO (PE) & ALHURES
Para isto, e depois de vencida ainda a Serra do
Pereiro, onde se registraram escaramuças com milícias e outras tropas
irregulares norte-rio-grandenses, teriam os revolucionários que passar
primeiramente, já em território paraibano, pelo Vale do Piancó, mais exatamente
pela Vida de Piancó.
Em Coremas (que os paraibanos conhecem mais por lá
se encontrar o afamado complexo hídrico de Coremas-Mãe d’Água), uma parte da
Coluna fez bivaque, para descanso dos homens. Bivaque é quando tropas acampam
ao ar livre, em barracas ou abrigos naturais, especialmente árvores — e, em Coremas,
havia, como ainda as há, muitas oiticicas, que fornecem sombra e refrescam os
campos.
Pretendia a Coluna Prestes, alternativamente,
ultrapassar o Vale do rio Piancó e dirigir-se à cidade de Patos, de onde
poderiam controlar as estradas principais para Campina Grande, para a Capital
da Paraíba e para a fronteira com Pernambuco.
Prestes e demais comandantes esperavam receber em
Triunfo (PE) notícias de seus aliados em Recife e na Capital paraibana, que
haviam prometido rebelar as principais guarnições locais do Exército. Isto não
foi possível, por causa de uma traição sofrida pelos revolucionários — mas, a
essa altura, ninguém no Alto Comando da Coluna sabia de tais fatos.
CHEGANDO À VILA DE PIANCÓ
Mas voltemos ao acontecimentos na Vila de Piancó,
naquela fatídica terça-feira, 9 de fevereiro de 1926.
Acredita-se que aquele pequeno grupo de
revolucionários, ao se deslocar pela rua do Conselho Municipal (uma espécie de
Prefeitura), sob o comando de nosso já conhecido, o capitão Pretinho, buscava
encontrar a sede da cadeia da Vila de Piancó. Aí, quem sabe, poder-se-iam
“requisitar” armas, munição etc. E, talvez, até soltar alguns presos vítimas de
perseguições políticas. Ocorre que um dos piquetes estava localizado justamente
na cadeia pública, sede da delegacia de Polícia.
Assim, quando esse minguado agrupamento de rebeldes
entrou na rua do Conselho Municipal, tiros vindo do piquete dos policiais
comandados pelo sargento Manuel Arruda feriram mortalmente o Capitão Pretinho,
um dos mais queridos coluneiros.
Seguramente, na Vila de Piancó, foram feridos, uns
mortalmente, outros não, os capitães Manoel de Oliveira Pires (capitão
Pretinho) e João Batista dos Santos, além do tenente Agenor Pereira de Sousa.
Como se viu, perdeu também a vida o sargento Lino (Laudelino da Silva), dizem
uns que com um tiro no peito, ao passo que outros sustentam que foi na cabeça.
Houve um momento em que o padre Aristides ordenou
se levantasse, na casa, um pano branco, pedindo trégua, que foi concedida. Era
para a cozinheira (eventual) da residência, Dona Antônia César de Lima, deixar
o local com duas crianças, o que foi feito. Logo depois, o tiroteio
recrudesceu.
ENTRE MORTOS & FERIDOS
No livro de Lourenço Moreira Lima, lê-se que
“caíram feridos, logo no início do combate, e quando avançavam
desassombradamente contra a cadeia, os Capitães Manoel de Oliveira Pires e João
Batista dos Santos, além de vários soldados, alguns dos quais igualmente
mortos.
Quanto ao tenente Agenor Pereira de Sousa, que, no
embate de Piancó, havia sido também ferido — mortalmente ferido, como se veria
depois —, ele foi levado pelos companheiros. Mesmo sem poder andar, continuou
assim a marcha, levado pelos amigos. A 7 de abril de 1926, chegou de padiola à
cidade baiana de Minas do Rio de Contas [inicialmente o povoado de Pouso dos Crioulos
e depois a antiga Vila Nova de Nossa Senhora do Livramento das Minas do Rio de
Contas, hoje apenas Rio de Contas, integrante do polo ecoturístico da Bahia],
para onde
seguira a Coluna Prestes, ao deixar Pernambuco.
VIVANDEIRA TAMBÉM DEGOLADA
Riocontenses se condoeram do realmente grave estado
de saúde do tenente Agenor. Seus companheiros de Coluna, sabendo que, de fato,
lhe restavam poucos dias de vida, lá o deixaram, no Rio de Contas, aos cuidados
da população, de seu irmão Alibe (de 17 anos de idade) e de uma belíssima
vivandeira, Albertina (de seus 22 anos). Ela era também gaúcha e,
aparentemente, caíra de amores pelo ferido.
Para azar geral, depois que a Coluna Prestes deixou
a cidade, apareceu por lá um "batalhão patriótico". Um dos tenentes dessa
tropa de mercenários, agindo ainda mais miseravelmente do que costumam agir os
de sua laia, degolou não apenas Albertina como da mesma forma Alibe — porque
ela se recusara a satisfazer seus apetites sexuais. Esse miserável ainda
circulou com a cabeça decepada da moça, mostrando-a aos soldados legalistas,
com risos de mofa.
GRUPO VOLTA COM REFORÇOS
O pequeno grupo da Coluna Prestes que antes das 8 h
da manhã penetrara na Vila de Piancó foi rijamente atacado e se retirou às
pressas ou como pôde, deixando estendido ao chão, morto, o capitão Pretinho,
além do cavalo desse, também atingido pela fuzilaria, e soldados que perderam a
vida logo no primeiro momento.
Mas, cerca de 20 minutos depois, o mesmo grupo de
revolucionários retornou, só que dessa vez altamente reforçado com gente do
Destacamento Cordeiro de Farias.
Logo depois, acudiam também efetivos do
Destacamento Djalma Dutra. Foi então gravemente ferido o tenente Valfrido,
desse último Destacamento de Djalma Dutra, que avançava para o centro da Vila
de Piancó, em apoio aos homens do Destacamento de Cordeiro de Farias.
“TODO O PIANCÓ QUEIMADO”
Irados com a má recepção vinda dos habitantes e
principalmente com a morte do Capitão Pretinho, cuja vida "todo o Piancó,
queimado, não pagaria", os homens de Prestes se lançaram sobre a Vila
dispostos a vingar a perda e punir os responsáveis pelo que consideravam uma
traição.
Em inícios da tarde, muitos dos defensores da
cidades arranjaram jeito de fugir. Permaneceu apenas o grupo liderado, numa
casa, pelo padre Aristides, sob intenso tiroteio.
REVOLUCIONÁRIOS MAIS IRRITADOS
Quando a porta da frente se abriu, um sargento da
Coluna Prestes, Laudelino da Silva (Lino), também muito querido entre os
revolucionários, tentou entrar na casa, de arma em punho. Mas caiu morto, ao
levar um tiro vindo do interior da residência. Uns escrevem que ele foi
atingido no peito; outros, que foi na cabeça.
Essa nova baixa fez com que os atacantes da casa
perdessem de vez a paciência. Irritadíssimo, o comandante Djalma Dutra mandou
que o sargento João Baiano fosse buscar uma lata de gasolina numa oficina
mecânica (Dutra vira a lata ao passar por lá) e a jogasse numa janela frontal
da casa. A intenção era incendiar a residência, para ver se os resistentes se
rendiam. A gasolina explodiu com estrondo. Em seguida, foram jogadas no
interior da casa, pela janela, algumas bombas de gás ou de efeito moral, claro
que ainda com o objetivo de forçar uma rendição.
Aproveitando que a atenção geral se voltava para
essa janela frontal, dois dos amigos do padre tentaram fugir por uma janela
lateral. Só um teve êxito, embora ferido. O outro, também baleado, morreu na
hora.
NÃO ACREDITARAM QUE ERA PADRE
Finalmente, os rebeldes conseguiram penetrar na
sala da frente da residência, ainda enfrentando resistência no corredor.
O Padre — que não estava de batina, mas de calças e
camisa comuns, em cor branca, com suspensórios — finalmente se entregou,
pedindo clemência para os seus e declarando sua condição de sacerdote.
— Padre?! Que nada! Você vai é pagar com a vida
pela morte de nossos companheiros! — disseram-lhe os irados revolucionários.
COMO FOI O BÁRBARO TRUCIDAMENTO
O padre Aristides e seus homens remanescentes
viram-se arrastados da casa para um barreiro próximo.
Sabendo que, certamente, iria morrer degolado,
segundo o bárbaro costume de cangaceiros, jagunços, macacos, policiais
militares e até soldados da Coluna que os chefes não logravam conter, Aristides
insistiu em declarar-se sacerdote, ser o responsável por tudo e pedir clemência
para os amigos.
Pediu também que lhe dessem um tempo para rezar e
se preparar para a morte. Isto lhe foi igualmente negado.
O RITUAL DO SANGRAMENTO OU DEGOLA
E, na exaltação dos ânimos, ocorreu o sumário
ritual do trucidamento por degola. Inquirido, de joelhos e de costas para o
carrasco, o infeliz tem o queixo fortemente levantado para cima, de modo que fique
com a carótida à mostra e olhando para a face do verdugo. Súbito, este lhe
corta a garganta com profundo golpe de faca-peixeira ou facão. Tal qual se
sangra(va) um porco.
Gaúchos até ensinavam a “melhor técnica” de sangrar
um infeliz: mantém-se o prisioneiro de costas para o executor, com as mãos
amarradas para trás; coloca-se a ponta da faca junto à ponta do nariz da
vítima; esta, instintivamente, levanta o rosto a fim de não ser atingida nesta
parte do rosto pela arma branca; e o carrasco aproveita então para dar profunda
facada, de lado a lado, na garganta, cortando-lhe a carótida. A morte advém em
questão de minutos. Por isso é que a senhora que viu o corpo do padre Aristides,
à noite, à luz de um candeeiro, afirmou que havia “enorme buraco” na garganta
dele.
O BARREIRO TINTO DE SANGUE
O barreiro (que, obviamente, era cor de barro) logo
se tornou inteiramente tinto do sangue do padre e de seus companheiros. Depois,
um dos soldados chegou ao requinte de castrar Aristides e lhe enfiar os
testículos boca adentro.
Foi o padre Aristides o último a resultar
executado, tendo assistido, portanto, à degola de todos os seus
amigos/guarda-costas. Seu cadáver, segundo reza a tradição local, recebeu ainda
muitos socos e chutes, golpes de punhal e cusparadas.
INTERPRETAÇÃO DOS REBELDES
Assim interpretaram os revolucionários o episódio
do levantamento dessa bandeira branca e da degola dos defensores de Piancó, nas
palavras do “secretário” da Coluna Prestes, Lourenço Moreira Lima:
“A velha tradição da degola, que imperava nas
guerras civis dos Pampas, fora combatida pelos oficiais revolucionários como um
costume bárbaro. Porém, a torpeza do deputado-cangaceiro [refere-se, claro, ao
padre Aristides], simulando por duas vezes consecutivas um ato de rendição,
para disparar contra os adversários, havia despertado a fera. Miguel Costa e
Prestes não permitiram que seus comandados tornassem a se deixar dominar por
ela, até o final da Grande Marcha”.
IMPARCIALIDADE DE OTAVIANO
A esse e a outros pontos já respondeu muito bem, em
seu livro Os mártires de Piancó, o padre Manuel Otaviano.
Otaviano, que ocupou a vaga de vigário deixada por
Aristides em Piancó, não era propriamente amigo do padre Aristides, mas
conseguiu escrever livro altamente equilibrado sobre as trágicas ocorrências,
inclusive com os antecedentes — e as consequências, que, segundo o velho
Conselheiro Acácio, “sempre vêm depois”.
MORTO COM OS QUATRO FILHOS
Deixando os corpos do padre Aristides e de seus
companheiros no tal barreiro, os homens da Coluna Prestes ainda encontraram,
nas imediações da Vila de Piancó, outro amigo do padre Aristides. Este, tendo
recebido recente apelo do sacerdote no sentido de ajudá-lo a defender a
localidade, estava indo para lá com quatro filhos (e com bastante atraso, como
se vê), a fim de atender ao apelo do sacerdote, que ainda julgava vivo.
Esses cinco (o pai e os quatro filhos) foram também
mortos, tendo o corpo (ainda com vida) de um de seus filhos, ao que se diz,
sido amarrado à cauda de um cavalo e arrastado caatinga afora, até finar-se.
Enquanto isto, em Coremas, Prestes e outros altos comandantes da Coluna não
sabiam que esses fatos horrendos estavam acontecendo bem perto de seu lugar de
descanso.
MEMORIAL PADRE ARISTIDES
No lugar do trucidamento do padre Aristides, existe
Memorial cuja fotografia saiu publicada num dos mais recentes livros do mui
respeitável intelectual vale-piancoense Franciraldo Loureiro Cavalcante.
Franciraldo lá esteve, com outros luminares, como
Gonzaga Rodrigues e Francisco das Chagas Lopes — e pôde rever a lista das mais
de 15 vítimas do destino, além do padre, todos sacrificados nessa refrega que
ninguém podia prever e que ainda hoje paira, como mancha negra, acima da aura
de civismo e dos reais serviços prestados à democratização brasileira pela
impressionante Coluna Prestes.
MAIS DE 60 MORTOS?
Ao todo, morreram 23 piancoenses nesse incrível
recontro, sendo que a maioria foi degolada (sangrada). Eram eles quase todos
aqueles que se encontravam com o padre Aristides, em sua residência, e não
conseguiram fugir. Do lado da Coluna Prestes, as informações dos próprios
revolucionários, se críveis, são de que teriam morrido nada menos que 40
homens, enterrados por seus companheiros, lá mesmo, em Piancó. Mas o Vale do
Pajeú reclama a honra de ter o cadáver do capitão Pretinho sepultado às margens
do rio que lhe dá nome...
Um dos amigos do padre Aristides — que escapara da
morte pulando uma janela da casa-piquete, embora tendo levando um tiro — foi
quem liderou, no dia seguinte, quarta-feira, 10 de fevereiro de 1926, o
sepultamento dos corpos do sacerdote e de seus companheiros de infortúnio.
O combate em Piancó durara das 8 h da manhã,
aproximadamente, até as 3 h da tarde.
COLUNA PRESTES EM PERNAMBUCO
Já na madrugada do dia 13 de fevereiro (pouco mais
de três dias após o sangrento combate em Piancó), a Primeira Divisão
Revolucionária da Coluna Prestes alcançava o território pernambucano.
Aí penetrou num ponto situado entre 1) a localidade
de Ingazeira — a 390 km de Recife e na região do Pajeú, não devendo Ingazeira
ser confundida com seu antigo distrito de Afogados de Ingazeira, hoje
município, também às margens do rio Pajeú — e 2) o município de Flores, também no
Vale do Pajeú e perto de São José do Egito, Triunfo e Serra Talhada.
Tanto que, logo, no mesmo dia 13, os
revolucionários estavam na Vila de Triunfo, conforme acertado com o tenente
pernambucano Cleto Campelo — que se responsabilizara por rebelar as guarnições
militares de Recife e da Capital paraibana. Mas este já é outro trepidante
episódio da Coluna Prestes.
LIVRO DO DESEMBARGADOR CORIOLANO
A propósito, e como adiante será mais
detalhadamente referido, sairá brevemente outro livro do Desembargador
Coriolano Dias de Sá, do qual somos Editor. Esta nova obra intitula-se
justamente Roteiro da Coluna Prestes e esmiúça o percurso (e a
repercussão) da Coluna em todo o País, especialmente, na Paraíba e em Piancó.
Um dos mais importantes documentos reproduzido pelo
Desembargador, nesse livro, é o relatório apresentado pelo então
tenente-coronel Elysio Sobreira ao Governo do Estado da Paraíba, com detalhes
sobre a constituição dos tais “batalhões patrióticos” que combatiam a Coluna
Prestes.
Citando especificamente o “batalhão patriótico”
organizado no Ceará para caçar os revolucionários na Paraíba, dizia o militar,
à época, que esse agrupamento “cívico-militar” era em 90% formado por
criminosos comuns, bandoleiros, cangaceiros, estupradores, assassinos
profissionais e por aí vai.
BANDIDOS NO ENCALÇO DA COLUNA
Esses “soldados” irregulares, arrebanhados pelos
Governos estaduais fiéis ao presidente Artur Bernardes para combater a Coluna
Prestes, arrombavam portas, achacavam chefes políticos e suas famílias e
promoviam outras insanas barbaridades.
Assim fizeram especialmente em Sousa, com o
coronel Aproniano Gomes de Sá, “a quem deram prejuízos incalculáveis”; com o
coronel Emygdio [Emídio] Sarmento, ameaçado de morte se não lhes desse o que pediam;
com Avelino Queiroga, de quem exigiram, “para fazer frente às despesas com seu
pessoal”, a nada módica quantia de 1.000$000 — um mil mil réis ou um milhão de
réis, isto é, um conto de réis, soma que daria aproximadamente para comprar um
quilo de ouro, erguer grande parte de uma igreja ou construir um quilômetro de
ferrovia...
DESMANDOS EM TODO O SERTÃO
Mas tais desmandos não ocorreram apenas em Sousa.
Aconteceram igualmente em Pombal, na Vila de Piancó, no então
povoado de São José da Lagoa Tapada, em Coremas, em Santana
dos Garrotes, em Misericórdia [Itaporanga], em Princesa
[Isabel], em Patos...
A ação desses bandos de celerados travestidos de patrióticos,
tomando à força bens de famílias sertanejas, na Paraíba (como aconteceu também
noutros Estados) redundou em “prejuízos talvez superiores aos que nos deram os
rebeldes”, resume o tenente-coronel Elysio Sobreira. tenente-coronel Elysio
Sobreira...
FOI O PRIMEIRO LIVRO QUE LI
Sem contar os gibis, o primeiro livro que li foi...
Os mártires de Piancó. Era essa a primeira obra a contar em detalhes o
lamentável trucidamento do padre Aristides Ferreira da Cruz e mais de 20 outras
pessoas, em 1926, por um contingente da Coluna Prestes, de passagem pelos
Sertões paraibanos.
Meu pai adquirira o histórico volume em Patos
mesmo, diretamente do Autor, o padre Manuel Otaviano. Estávamos em 1954, tinha
eu uns 8 anos e foi lá, no livro sobre a “tragédia de Piancó”, que por vez
primeira me abismei com a ferocidade humana — e também deduzi o significado do
verbo recrudescer sem precisar recorrer ao pai-dos-burros. Talvez por
isso nunca tenha abandonado, como os sertanejos em geral, o interesse pelo
mavórtico episódio ocorrido na antiga Vila do Piancó.
MAIS SOBRE A
RESIDÊNCIA-PIQUETE
Mas vamos ao que interessa. Esta dominical página
especial de A União da semana passada — sobre a instrumentalização
literária do padre Aristides Ferreira da Cruz (1872-1926) como personagem en
passant de dois grandes romances brasileiros (O arquipélago, de
Érico Veríssimo, e No coração das perobas, de Domingos Pellegrini),
assim como na Literatura de Cordel — veio a despertar mais atenção entre os
leitores do que se esperava.
Assim, hoje, procura-se apresentar aqui novas
informações sobre a sangrenta jornada que o então jovem repórter Praxedes
Pitanga chamou de “a hecatombe de Piancó”.
Voltemos mais uma vez à fatídica terça-feira, 9 de
fevereiro de 1926, quando se deu essa “chacina de Piancó”. Entre os que lá se
achavam bem armados e municiados, ao lado do padre Aristides Ferreira da Cruz,
defendendo a residência-piquete, na Vila piancoense, estava também o
distribuidor em Juízo Hostílio Túlio Gambarra.
DEFENSORES
NÃO ERAM “ANDRAJOSOS”
Quem leu o excelente livro de Domingos Meirelles
sobre a Coluna Prestes, intitulado A noite das grandes fogueiras
[Editora Record, São Paulo, 1998], há de se lembrar que os defensores do padre
são aí apresentados como uns maltrapilhos, pés-rapados, facínoras andrajosos,
cangaceiros desdentados e por aí vai. Mas não eram isto, não! —
protestam os piancoenses de ontem e de hoje, para quem só o desconhecimento da
realidade local permitiria afirmações desse gênero.
Tome-se o caso de Hostílio Túlio Gambarra. Ele
também se achava entre os que, de armas em punho, junto ao padre Aristides,
defendiam Piancó de algo que achavam ser um “ataque da Coluna Prestes”. Ele ali
não se encontrava apenas como um mero combatente “sem causa” ou como um wrong
man in the wrong place at the wrong time — mais um homem errado no lugar
errado e na hora errada.
Além do padre, estavam entre os que pegaram em
armas não apenas o prefeito local, João Lacerda Moreira de Oliveira, e seu
filho, o comerciante Osvaldo Lacerda Moreira de Oliveira, mas também o já
citado Hostílio Túlio Gambarra, benquisto serventuário da Justiça; um escrivão
do distrito de Aguiar, Manoel Clementino de Sousa; um escrivão da Coletoria
Federal em Piancó, Antônio Clementino de Sousa (filho do anterior); e outras
pessoas de destaque local.
ERA TAMBÉM
UM GESTO POLÍTICO
Enxergar os defensores de
Piancó apenas como matutos andrajosos sem eira nem beira constitui, no
mínimo, lamentável amostra dos preconceitos alimentados por muitos sulistas
contra os nordestinos. Além do mais, o auxílio de Hostílio e dos demais
combatentes ao padre Aristides representava gesto político.
Eles formavam significativa parcela do grupo
partidário que apoiava localmente o sacerdote, inclusive elegendo-o duas vezes
deputado estadual. Também localmente combatiam a família Leite, cujo maior
representante no Distrito Federal de então (a Capital da República, no Rio de
Janeiro) era o deputado federal Felizardo Toscano Leite.
Mas não devem admirar-se os leitores se, entre os
que tombaram ao lado do padre, estivessem pelo menos dois de sobrenome Leite —
esses eram de uma dissidência política da família.
HOSTÍLIO,
AVÔ DE JORNALISTAS
Em tempo: esse mesmo Hostílio Túlio Gambarra — que
não se perca pelo pomposamente duplo prenome romano, bem ao gosto do
bacharelismo então ainda mais vigente no Brasil do que hoje — vem a ser avô
materno do jornalista José Napoleão Ângelo. Napoleão é editor de Opinião do
jornal A União e primo do jornalista e professor Orlando Ângelo, este
radicado em Campina Grande.
O colega de Imprensa Napoleão Ângelo, aliás, é o
jornalista de A União que recebeu esta página por e-mail, por nós
enviada, e que a preparou, com seus companheiros de Redação, para que, depois
de passar pelo crivo do Editor-Geral Sílvio Osias, pudesse circular bem
arrumadinha, hoje, nesta edição dominical do jornal oficial do Estado da
Paraíba.
ERA
CORRELIGIONÁRIO DO PADRE
Nesse quixotesco enfrentamento do padre Aristides
com um relativamente pequeno grupo da Coluna Prestes, Hostílio ficou ao lado do
padre Aristides Ferreira da Cruz simplesmente porque era amigo do sacerdote.
Como os demais companheiros do padre Aristides, que igualmente permaneceram na
Vila de Piancó para ajudá-lo naquele transe, não tinha razões ou informações
suficientes para alimentar simpatias ou antipatias por Prestes e por seus
homens.
Vivendo nos confins dos Sertões paraibanos,
Gambarra — como a esmagadora maioria dos brasileiros da época — não podia
entender direito o que queriam realmente os revolucionários comandados por Luís
Carlos Prestes, Miguel Costa, Siqueira Campos, Juarez Távora, João Alberto Lins
de Barros, Osvaldo Cordeiro de Farias, Djalma Dutra, Ari Salgado Freire et
alii. Uns desses eram realmente autênticos idealistas, patriotas,
reformistas. Outros, nem tanto, como fatos posteriores demonstrariam.
MEDO
TRANSFORMADO EM CORAGEM
Gambarra devia sentir
o que os demais sentiam: medo ante a aproximação da Coluna Prestes. No
Nordeste, ocorria da mesma forma que noutras partes do Brasil: a Coluna ora era
recepcionada com gritos de “viva!” e banquetes, ora era simplesmente recebida à
bala mesmo, ao estilo da lei-de-chico-de-brito.
Isto dependia da localidade, da situação política
do Estado, das relações dos habitantes com os esquemas locais de Poder. Medo
todo mundo tinha. Mas havia alguns que transformavam o medo em coragem e até
bravura, fosse para o bem, fosse para o mal, de modo que pegavam em armas e iam
enfrentar a desconhecida fortuna: matar ou morrer; ferir ou ser ferido; dar
adeus à vida ou escapar para contar a história.
CASA FOI
SAQUEADA E QUEIMADA
Segundo José Napoleão Ângelo, a História
esqueceu-se de dizer que, depois do trucidamento do padre Aristides e já
estando longe os homens da Coluna Prestes, a residência do sacerdote foi
saqueada por inimigos políticos, jogando-se seus pertences numa fogueira.
O mesmo ocorreu com a casa e outros bens de seu
amigo, partidário e companheiro do fatídico combate, Hostílio Gambarra.
CASA ARDEU
(E FUMAÇOU) ATÉ QUE O CALOR DO
INCÊNDIO
DERRETESSE AS ÚLTIMAS RAPADURAS
Por ser piancoense da gema é que o jornalista
Napoleão Ângelo, neto de Hostílio Gambarra, terminou aluno de Joanita Ferreira,
filha do padre Aristides com sua mulher Maria José (Quita). Isto ocorreu no
Grupo Escolar “Adhemar Leite”.
Localizado no centro de Piancó, esse
estabelecimento de Ensino tem mais de 75 anos de existência. Por ironia do
destino, foi erguido sobre as ruínas do antigo sobrado do padre Aristides,
prédio que ardeu e/ou fumaçou por dias, até que o calor do fogaréu consumisse
as últimas rapaduras ali armazenadas.
OS FILHOS DO
PADRE ARISTIDES
O padre Aristides conhecera sua futura mulher, a
então ainda adolescente Maria José (Quita), no coro da igreja local. Visitara-a
frequentemente na casa dos pais, na localidade Água Branca. Mas, com o
falatório surgido em torno desse seu interesse pela moça e já depois de
afastado das ordens religiosas, o padre mandara raptá-la, passando a viver
abertamente com ela.
Além de Joanita, que se tornaria professora, o
padre teve com Quita três outros filhos:
1) Jorge Ferreira da Cruz,
que, aborrecido com os adversários políticos e não apenas com os fatos ligados
à Coluna Prestes, depois se fixaria no Sudeste, jamais retornando à Paraíba e
vindo a falecer há alguns anos em Botucatu (SP);
2) Sebastião Ferreira da Cruz
(de quem, infelizmente, não disponho de maiores informações; e
3) Aristides Ferreira da Cruz
Filho, que por muitos anos foi fiscal de rendas do Estado da Paraíba; mas
não só por isto é citado no mais novo livro do Desembargador Coriolano Dias de
Sá; esta obra já foi concluída e será brevemente enviada ao prelo; tem o título
de Roteiro da Coluna Prestes e o Editor da obra vem a ser este criado
que ora vos tecla as presentes linhas).
UMA DEVOTADA
PROFESSORA
Foi por causa desse relacionamento marital com
Quita que o então bispo da Paraíba, dom Adauto, alertado pelo deputado federal
Felizardo Toscano Leite, suspendera em 1912 as ordens do padre.
Especula-se que, num desabafo posterior à punição,
Aristides teria dito, ao assumir abertamente o relacionamento com a namorada:
“O Bispo errou e me fez errar” — no sentido de que “já que estou sendo punido
por uma coisa que não fiz, vou arranjar um motivo real para a punição”.
Joanita, falecida em 2008, sempre manteve aquele
seu olhar altivo e severo, austero e penetrante — como mestra e como cidadã.
Poucos são capazes de imaginar o que sofreram ela, os irmãos e, principalmente
a mãe, por ser esta, na sociedade ainda mais preconceituosa da época, “a mulher
do padre”, para não falar nas sombrias circunstâncias em que o pai, o marido
resultou morto.
A mãe, Dona Quita, raramente falava a curiosos
sobre o passado. Mas Joanita, a filha, concedeu algumas entrevistas sobre o seu
pai e tudo o mais. Sem ter uma visão global sobre a Coluna Prestes e por haver
sido criada em ambiente de ódios políticos e desconfianças familiares,
equivocava-se em atribuir ao governador João Suassuna a armação de uma
“cilada” em que “caíra” o padre Aristides.
De outra parte, firmou seu nome como professora
local, ao lado de outras destacadas mestras: Loura Lopes, Terezinha Lacerda,
Chiquinha Freire, Dezinha Barreiro, Janete Lopes, Aracy Leite, Ernestina e
demais devotadas formadoras de gerações de vale-piancoenses.
QUATRO
PÁGINAS EM A UNIÃO
Tantas são as
informações, antigas e novas, sobre o episódio sangrento dos “mártires de
Piancó” que se fez necessário elaborar uma segunda página especial (e até uma
terceira!) em torno do distribuidor em Juízo Hostílio Túlio Gambarra, um dos
companheiros do padre Aristides nos terríveis acontecimentos.
Repita-se, para que fique bem gravado: Hostílio foi
um dos um dos mais de 20 piancoenses selvagemente mortos nessa terça-feira, 9
de fevereiro de 1926. Era amigo e correligionário político do padre que liderou
a defesa da Vila de Piancó, contra o que julgava ser um ataque à localidade por
parte da Coluna Prestes. Mas a Coluna somente estava vindo do Ceará/Rio do Rio
Grande do Norte e, tendo alcançado Coremas/Vale do Piancó, queria apenas seguir
para Patos, a Capital paraibana e/ou Pernambuco.
DITO DE
OUTRA MANEIRA
Destacamentos da Primeira Divisão Revolucionária da
Coluna Prestes estavam provisoriamente arranchados em Coremas e proximidades de
Piancó. E só pequeno grupo de homens do Destacamento Cordeiro de Farias entrou
na Vila de Piancó, ante a visão de bandeiras brancas espalhadas pelos caminhos
e nos telhados de algumas casas.
Esse pequeno grupo, liderado pelo capitão Pretinho,
querido entre os revolucionários, ingressava na Vila pela rua do Conselho
Municipal, quando foi alvejado a partir do piquete do sargento Arruda.
Os tiros feriram mortalmente o capitão e mataram
seu cavalo, além de ferirem/matarem uns quatro ou cinco outros coluneiros. O
grupo retirou-se às pressas da Vila, mas voltou, uns 20 minutos depois,
altamente reforçado por outros homens do Destacamento Cordeiro de Farias, aos
quais logo se juntaram muitos do Destacamento Djalma Dutra.
A ordem dos comandantes era arrasar a Vila, que tão
violentamente recebera o grupo avançado da Coluna. Os homens de Prestes
acreditavam haver sido vítimas de traiçoeira cilada: apesar das bandeiras
brancas, tinham sido recebidos à bala.
NÃO ERAM
COMBATENTES ANDRAJOSOS
Os que estavam com o padre Aristides num dos quatro
piquetes da Vila não eram maltrapilhos/andrajosos como alguns pensam — mas
lideranças políticas de Piancó, com seus homens de confiança, todos fortemente
armados.
Como só depois (e fatalmente muito tarde) ficaria
claro, jamais chegariam a ser páreo para o “exército”, numericamente bem
superior, dos Destacamentos da Primeira Divisão Revolucionária.
Aristides não estava por acaso à frente da defesa
da Vila. Era partidário do ex-presidente da República Epitácio Pessoa. Em 1922,
Epitácio determinara (com o emprego da Polícia e, se preciso fosse, até do
Exército) a recondução do padre Aristides à chefia política de Piancó.
O padre (suspenso das ordens religiosas pelo Bispo
Dom Adauto desde 1912) fora expulso da cidade, em 1922, pelos partidários dos
Leite, após tiroteio que durou 26 horas.
FAMÍLIA
LEITE & PADRE ARISTIDES
Com a família Leite, sua relação era como a seguir
se descreve.
De início, o padre Aristides foi uma espécie de
“cria” dos Leite, que lhe deram o apoio político inicial. O fato de ser vigário
da paróquia local fazia-o conhecido de toda a gente, inclusive nos sítios.
Logo, porém, o padre intuiu que se havia tornado
uma liderança piancoense. Sentiu-se capaz de alçar novos voos, sozinho, isto é,
no que hoje se chama carreira solo. “Engrossou o pescoço” e não quis
mais ser liderado pelos Leite. Dali por diante, seria ele próprio um líder.
Claro que, numa terra, como muitas outras, dividida
em acirradas facções políticas, conseguiu apoio (inclusive dos Leite
dissidentes) e chegou a ser eleito e reeleito deputado estadual. Isto para
grande desgosto da maioria dos Leite, que tinham no deputado federal Felizardo
Toscano Leite o seu líder regional.
O APELO DE
JOÃO SUASSUNA
Para defender a Vila de Piancó, o padre procurava
também cumprir apelo telegráfico do então presidente paraibano João Suassuna no
sentido de obstar a passagem da Coluna Prestes por Piancó. E, além disso,
tentava mostrar que era realmente o chefe político da Vila, embora estivesse
redondamente enganado quanto à Coluna estar faminta, sem munição e caindo pelas
tabelas.
Amigos tentaram dissuadir
o padre Aristides: não devia enfrentar a Coluna, que, ao contrário do que
inicialmente se supunha, chegara ao Vale do Piancó altamente municiada e
fortalecida. Disseram-lhe também: saia da cidade com a família, que a
gente se encarrega de enfrentar a Coluna. Mas o padre teimou em permanecer.
Afinal, onde estava seu brio?!
Tomada a decisão, ficaram a seu lado o distribuidor
em Juízo Hostílio Túlio Gambarra, benquisto em toda a região, e vários outros
correligionários políticos.
AS FILHAS DE
HOSTÍLIO GAMBARRA
Uma das 23 vítimas piancoenses do destino, naquele
pavoroso dia, Hostílio era casado com Gualterina Gervásio de Sousa Cavalcanti e
deixou os filhos:
1) Anita Cavalcanti (Ângelo) Gambarra;
2) Antônia Cavalcanti (Ângelo) Gambarra (Dona
Tonhita, mãe do jornalista José Napoleão Ângelo);
3) Gualterina Cila Cavalcanti (Nunes) Gambarra; e
4) e Dagmar Cavalcanti (Nitão) Gambarra.
Com a trágica morte de Hostílio, um piancoense
tomou a si a tarefa de criar suas quatro filhas, juntamente com seus próprios
filhos e como se fossem irmãos deles. Este homem foi Inácio Liberalino de
Sousa, que as acolheu em casa e lhes deu educação.
Muito franco, seu Inácio Liberalino jamais
negou haver fugido da Vila de Piancó (e se escondido muito bem) logo que o
tiroteio se iniciou e ele viu que a pequena localidade não tinha condições de
enfrentar o maciço poder de fogo dos guerreiros da Coluna Prestes.
Em seu testemunho, repetido muitas vezes, sempre
sustentou que o padre Aristides ainda tentou se render, levantando uma bandeira
branca, mas seu gesto não foi levado em consideração pelos homens de Prestes —
dando oportunidade, no entanto, a que um de seus combatentes conseguisse fugir,
apesar de ferido.
DONA TONHITA GAMBARRA
Uma das filhas de Hostílio, Antônia Cavalcanti
Gambarra, casou-se com Napoleão Ângelo da Silva, tendo os seguintes filhos:
a) Telma Rosicléa Ângelo Cavalcanti;
b) João de Deus Ângelo;
c) Luzia Aparecida Cavalcanti;
d) Rosa Cléia Ângelo Cavalcanti; e
e) José Napoleão Ângelo, o jornalista aqui
referido.
BOATOS, MENTIRAS, MEIAS-VERDADES
Como não poderia deixar de ser numa cidade pequena,
onde as rixas políticas são hereditárias, quase eternas, e as “lendas urbanas”
correm frouxas, houve acusações de todos os lados contra todas as partes, em
função da grande tragédia.
De um lado, acusava-se a família Leite de haver
“armado” toda a confusão, para acabar com a vida do padre Aristides, que se
tornara um adversário bastante incômodo; de outro, dizia-se que a armação
partira do governador da época, João Suassuna, que colocara o padre numa
“fria”, ao pedir que defendesse Piancó...
Surgiram até inacreditáveis outros boatos, como o
de que Suassuna teria infiltrado inimigos do sacerdote, “mascarados”, na
própria... Coluna Prestes (?!), para jogar os fortíssimos revolucionários
contra o quase indefeso padre...
Disse-se ainda que os Leite teriam enviado
“mensageiro” aos chefes da Coluna “informando” que o padre estava à espera
deles, armado até os dentes — como se os principais responsáveis pela Coluna
Prestes estivessem interessados em questiúnculas locais em torno do efêmero
Poder que eles próprios combatiam...
Estas são apenas algumas das mentiras ou
meias-verdades surgidas ao longo do tempo sobre tão dolorosos eventos. Mas tudo
parece decorrer daquilo a que se refere o antigo ditado português: “Em casa em
que falta pão, todo mundo grita e ninguém tem razão”.
NA REVISTA O
CRUZEIRO
Como mostrou a revista O Cruzeiro de 23 de
abril de 1955, quem se responsabilizou pela guarda das filhas de Hostílio
Gambarra foi o coletor e Inácio Liberalino de Sousa. A longa reportagem na
revista dos Diários e Emissoras Associados do jornalista e magnata da Imprensa
Assis Chateaubriand é assinada por A. Monteiro e intitula-se “O Padre
Sangrado”.
Por motivos mais que óbvios, o jornalista Napoleão
Ângelo guarda um exemplar desse número da então maior revista semanal
brasileira, que apresenta, entre outras, muitas fotos de interesse:
■ a casa em
que o padre Aristides se entrincheirou com Hostílio e os demais
correligionários;
■ o professor
Conrado, de Piancó, mostrando o local em que foram degolados o padre e seus
defensores [nada a ver com a história, mas valha como curiosidade: o mestre
Conrado, por esse tempo, era o único em Piancó a entender língua
inglesa!];
■ a mulher do
padre Aristides, Dona Quita;
■ uma foto (a
única que sobrou) do próprio padre Aristides.
Mas não existem fotos de Hostílio — elas foram
todas destruídas pelo saque, incêndio e destruição promovidos por seus inimigos
políticos, depois de seu assassinato do padre Aristides e seus companheiros.
PRAXEDES
PITANGA: A “HECATOMBE”
Muito antes de a Imprensa, os poetas de
bancada/cordel, e o padre Manuel Otaviano escreverem sobre os “mártires de
Piancó”, o então muito jovem repórter Praxedes Pitanga já tocara irada e
candentemente no assunto.
Isto ocorreu pouco dias depois da tragédia, como o
historiador Deusdedit Leitão mostrou há alguns anos em artigo escrito para esta
mesma A União.
Praxedes trabalhava então para um pequeno jornal
(no estilo A Voz do Sertão ou Letras do Sertão e que circulava
apenas no Vale do Piancó) e publicou matéria ilustrada, em tom da mais alta
indignação contra a Coluna Prestes, revelando detalhes da “hecatombe de
Piancó”.
Foi essa, possivelmente, a primeira informação
aparecida, sob letra de forma, na Imprensa paraibana, a respeito dos
lamentáveis eventos no Piancó. Era o sangrento choque de duas visões diferentes
do que deveria ser o Brasil e seu futuro.
OS QUE
MORRERAM COM O PADRE
Segundo listas apresentadas por historiadores — de
Praxedes Pitanga e o padre Manuel Otaviano (Os mártires
de Piancó), até
Franciraldo Loureiro Lopes (Memorial das Famílias Pereira Cavalcanti e Lopes
Loureiro) —, foram mortas, na tragédia da terça-feira, 9 de
fevereiro de 1926, além do padre Aristides e Hostílio Túlio Gambarra, as
seguintes pessoas, num total de 23:
■ o Prefeito
local João Lacerda Moreira de Oliveira;
■ seu filho
Osvaldo Lacerda Moreira de Oliveira, comerciante;
■ o também
comerciante José Ferreira da Cruz (sobrinho do padre Aristides);
■ os
agricultores Joaquim Ferreira da Silva, Antônio Leopoldo, José e João Lourenço;
■ outro
agricultor e ex-praça da Polícia, Jovino Raimundo (conhecido por Quelé,
diminutivo de Clementino);
■ o guarda
municipal Rufino Soares;
■ Eloy e
Joaquim Severino Leite (pai e filho);
■ Manoel
Severino Leite;
■ José
Severino Leite;
■ Antônio
Cristóvão;
■ Manoel
Clementino de Sousa (escrivão do distrito de Aguiar);
■ um filho
deste, Antônio Clementino de Sousa (escrivão da Coletoria Federal em Piancó);
■ João
Ferreira;
■ Antônio
Custódio;
■ o motorista
Severino Rocha da Silva;
■ o
(ex-)detento Severino Guarabira; e
■ Vicente
Mororó.
Em contrapartida, tombaram mortos na Vila de Piancó
cerca de 40 homens da Coluna Prestes (dados dos próprios revolucionários), aí enterrados
no dia seguinte, por seus camaradas de armas.
DONA DAGMAR
& SEU PRIMÊNIO
Das filhas de Hostílio Túlio Gambarra, uma
remanesce, em plena lucidez: Dagmar Gambarra, irmã de Dona Antônia Cavalcanti
Gambarra e, portanto, tia de Napoleão Ângelo. Dagmar é viúva de Pedro Ventura
Nitão, o Primênio que fazia as delícias dos contadores (e ouvidores) de
histórias da Paraíba antiga, quando o Ponto de Cem-Réis, no centro da Capital,
ainda era o ponto de encontro dos pessoenses, seu tambor de repercussão, sua
tribuna, sua ágora política.
Primênio faleceu em 2007, em Brasília (DF), onde
ultimamente residia. Em João Pessoa, para quem se lembra, ele foi tesoureiro
dos Correios e Telégrafos. Tinha aguçada presença de espírito.
“NÃO DIGA
QUE ME VIU”
Para dar certo tom de humor em meio a tantos fatos
trágicos, conta-se que, certa vez, num dos bares que Primênio costumava
frequentar nos bairros de Jaguaribe e Tambaú, estava em grande roda de amigos,
quando o grupo foi abordado por um pressuroso garoto de recados:
— Quem é aqui “seu” Pedro
Ventura, dos Correios?
— Sou eu, menino — respondeu
Primênio, de pronto — Por quê?
— Mandaram chamar o Sr. Tem um
homem importante dos Correios procurando o Sr. na Agência Central!
Sem alterar-se, Primênio entregou
ao menino uma cédula (hoje correspondente a uns 10 reais) e lhe disse:
— Tome, esse dinheiro é seu. Mas
não diga a ninguém que me viu, tá bem?!
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Versão reduzida deste artigo foi
originalmente publicada na última página do jornal A União, de João
Pessoa (PB), em 9 de janeiro de 2010 — e outros trechos serão reproduzidos nas próximas
três edições dominicais do mesmo jornal.
Esse artigo tem base em pesquisa, livros e Literatura de cordel, seus fatos na narração, feita na mesma semana na imprensa Estadual, pelo senhor Sebastião Dantas, testemunha ocular.
- Deu início ao primário no Colégio de Antônio Gomes Barbosa. Segundo Padre Otaviano, não era um bom aluno, pois não demonstrava interesse pelo Português e Latin. Sendo ele um pouco abstrato, tinha um vocabulário exíguo, soltando por várias vezes, verdadeiros disparates, durante a conversação. Nunca havia lido uma poesia, e não lhe agradava a literatura.
- Recebeu, no dia 1 de Novembro de 1901, das mãos de Adauto Aurélio de Miranda Henriques, Bispo da Diocese da Paraíba, a coroa de Sacerdote.
- Em 25 de Agosto de 1902 passou a ocupar a função de novo vigário da Freguesia na Vila de Piancó, onde entrou triunfantemente.
- Em Julho de 1912 foi afastado do comando da Igreja, por não obedecer ordens emanadas da Diocese da Capital.
Assim fincando raízes não só em suas coerentes posições, mas também na cidade.
- Em 1915, foi eleito Deputado. Agora as rédeas da política piancoense, anteriormente comandada pela Família Leite, estava em suas mãos. Foi reeleito por mais duas legislaturas consecutivas.
O conflito
Região situada no Oeste do estado brasileiro da Paraíba, o Vale do Piancó foi um dos locais por onde a Coluna Prestes esteve em sua incursão. Para muitos seriam os "Cavaleiros da Esperança", mas para outros, essa corrente de cunho militar, liderada por Prestes e com idéias comunistas, era mais um grupo que abalaria a região com suas idéias mas, quando com o poder em suas mãos, não faria nada para ajudar realmente a população pobre da região [carece de fontes].É provável que uma certa "rivalidade", que pode ser notada no Brasil, entre Nordestinos e Sulistas tenha também alimentado esse foco de resistência na cidade de Piancó, aos pés da Serra de Santo Antônio [carece de fontes]. Contudo não pode ser explicado a real motivação dos "heróis do Piancó", mas essa batalha esta listada como uma das grandes resistências a Coluna [carece de fontes].
Como supor que essa incursão de revoltosos no território paraibano teria como epílogo uma tragédia na Vila de Piancó [carece de fontes].
Claro na Wikipédia devemos nos conter apenas a imparcialidade, porém a mesma não é observada em vários livros de história, onde a defesa da atitude do grupo de Prestes é diretamente ligada as idéias do escritor e nem de longe contestadas [carece de fontes]. Por esse motivo não está clara a idéia que levou a um padre do interior nordestino, ligado a política local, e identificado por sua população como um grande líder, a organizar um grupo armado, e muito menos os ideais que levaram alguns civis a se juntarem nesta causa [carece de fontes].
De evidente, temos apenas o fato de não discutirmos - pois não há dúvidas - o trucidamento frio e requintado do Padre, chefe da política local, e de mais 16 pessoas, entre as quais estão o Prefeito Municipal, funcionários públicos e pessoas humildes [carece de fontes].
Sendo assim, esta lógica nos leva a crer que nem tudo que lemos sobre Prestes é verdade, e que o fato de sua passagem pelo sertão agrediu a população, pois para muitos nordestinos o nome Coluna Prestes é clara referência a má conduta militar e um tempo de medo e crueldades que por muitas vezes, como é o caso de Piancó, faziam uma cidade inteira fugir, aguardar e retornar para suas casas e lojas, agora saqueadas pelos rebeldes [carece de fontes].
Início dos fatos
A notícia da ocupação de Coremas, que fica a 28 km de Piancó, foi divulgada na tarde de segunda-feira dia 8 de fevereiro de 1926, e durante a noite iniciou a retirada das famílias que, pelo vexame em que saiam, abandonaram residências, muitas roupas e utensílios, ficando a Vila quase despovoada. Permaneceram exclusivamente as famílias de Manoel Cândido, Ten. Antônio Benício e seu destacamento policial composto por 15 praças, o alfaiate Isidoro, Padre Aristides e amigos, civis armados armados do Sr. João Galdino, e outras pessoas que se ofereceram.9 de fevereiro de 1926
Às 06:30 da manhã chegara a Piancó o Ten. Manuel Marinho, vindo de Patos em um caminhão, conduzindo armas, munição e cinco praças, somando assim um total de 20 soldados.Quando Sargento Arruda fazia a distribuição do armamento e munição, e Ten. Benício organizava os quatro piquetes a Coluna penetrava na vila pela rua do Conselho Municipal.
Segundo Sr. Dantas os primeiros disparos foram da Coluna, já Pe. Otaviano, em seu livro "Os mártires de Piancó", afirma que o primeiro tiro fora dos piancoenses. Histórias populares dizem que o primeiro oficial vinha montado, vestindo culotes, paletó azul-marinho e portando uma bandeira branca.
Mas não há certeza.
Sargento Arruda e outros resistiram na casa do Juiz Dr. Abdon Assis em frente ao Conselho. A Coluna recuou, retornando vinte minutos depois procurando envolver a Vila pelo nascente e poente. Do lado Sul havia dois piquetes, um comandado pelo alfaiate Isidoro e Francisco Lima, e outro por amigos de Pe. Aristides na casa do Sr. Mario Leite.
Foi possível manter resistência até às 14:00 horas, sendo feita uma retirada dos piancoenses, uma vez verificada a impossibilidade material de prolongar a luta. Entretanto, o pessoal do Padre continuou resistindo ainda por meia hora quando, para facilitar o ataque, os rebeldes jogaram uma granada numa das janelas e tomaram as salas da frente, havendo ainda alguma resistência brevemente cessada, com recuo dos sitiados para o interior da casa onde estava o Padre. Em fuga foram atingidos José Lourenço e João Monteiro. Esse último, embora ferido, conseguiu escapar.
Também escaparam uma criada e duas crianças que se evadiram às 13:00 horas.
Sangue no Barreiro
Havia poucos vestígios de sangue na casa. O padre e seus amigos foram conduzidos ainda com vida para o barreiro. É com comoção que pessoas mais antigas da cidade contam que o barreiro estava completamente tinto de vermelho. Veja agora as palavras de um dos rebeldes, em Santana dos Garrotes, que ajudaram a trucidar o Padre."Perdemos um oficial, que todo o Piancó queimado não pagaria, mas, também o chefe, Padre Aristides, foi para a sepultura, num barreiro, com seus próprios pés"
14 de fevereiro 1926
Integrantes do Jornal O Combate, editado em Cajazeiras adentraram na cidade nesse dia e localizaram a mulher que fugiu por ordem do Padre. A mesma narrou o fato: o Padre sentindo-se cercado mandou ao muro Rufino, seu guarda de confiança, a ver o que era possível fazer. Rufino, deparando-se com o ataque, voltou e disse ao Padre que, se saíssem morreriam e se ficassem dentro de casa haviam de morrer. Nesse momento dos enormes estampidos se fizeram ouvir: eram granadas e bombas de gás. O pessoal que brigava sentiu forte dor de cabeça, não havendo remédio o Padre aconselhou o uso de açúcar. Sendo a casa invadida o pessoal resistia no corredor.Pediu o padre para todos garantia de vida, solicitação que teve o consentimento dos rebeldes sob a condição de deporem armas. Pegado o Padre em às mãos, para logo começarem os ultrajes.
Texto Anexo
Carta de Suspensão do Pe. Aristides"Ao Remº Padre Aristides Ferreira da Cruz.
Tendo chegado ao nosso conhecimento a falta de obediência as nossas paternas admoestações, feitas pessoalmente a Vosso irmão, para fatos que desabona inteiramente a dignidade sacerdotal e até mesmo do homem de bem, o que infelizmente vemos comprovado e ao domínio de todos, com pesar retiramos de Vosso irmão, o exercício de todas as sagradas ordens, até que tenhamos a obediência que sempre temos recebido do nosso clero.
Prezo ao Sagrado oração de Jesus que o irmão, bem se compenetre da gravíssima responsabilidade que tem diante de Deus, servindo de escândalo a Igreja de Nosso Senhor Jesus Cristo."
Paço Episcopal da Paraíba. Em 16 de Julho de 1912. Adauto, Bispo Diocesano.